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TRABALHISTA - Terceirização das atividades-fim: o que muda após decisão do STF?



Comum em muitas empresas, a terceirização das atividades ganhou novas possibilidades com a aprovação da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), em agosto de 2017. Até então, a contratação de terceirizados era liberada apenas para funções consideradas como atividades-meio nas empresas, como os serviços de limpeza e segurança. As instruções vinham do único texto legal sobre o tema: a Súmula 331, publicada em 2011 pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

A nova legislação, porém, passou a permitir que as empresas terceirizem todos os seus setores, incluindo as atividades-fim (essenciais para a sua manutenção). Agora, uma empresa do ramo de sistemas, por exemplo, poderá contratar funcionários terceirizados para a elaboração e execução dos seus softwares.

Em agosto deste ano, a possibilidade ganhou ainda mais força após o Supremo Tribunal Federal (STF) ajuizar duas ações movidas antes da homologação da Reforma Trabalhista, julgando como constitucional a terceirização das atividades-fim.

Nas ações, empresários reivindicavam o direito de terceirizar outros setores de sua empresa, questionando o prescrito na Súmula 331 do TST. Segundo os ministros que votaram favoravelmente à causa, a política já é empregada em outros países industrializados, de modo que o Brasil não poderia caminhar na contra-mão da tendência.

Em seus votos (favoráveis), os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux, relatores dos processos, resguardaram que os empresários são livres para estabelecer como contratam seus funcionários. Defenderam também que a medida de constitucionalizar a terceirização impactará positivamente a livre concorrência e ajudará a diminuir o desemprego no país que, segundo levantamento realizado pelo IBGE em setembro, castiga cerca de 13 milhões de brasileiros.

Para Flávio Roberto Batista, Professor Doutor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), a medida tende a beneficiar somente as empresas, esquecendo os trabalhadores. “A decisão do STF mostra um compromisso bastante claro com o empresariado, único beneficiado pela decisão”, dispara . “A conta é simples: se a empresa que terceiriza economiza ao fazê-lo e a empresa terceirizadora lucra, a única conclusão possível é que o trabalhador deve perder”.

Batista também enaltece que os países centrais proíbem a terceirização, uma vez que a prática “não seria tolerada pelos cidadãos”. “Aqui, difunde-se a falsa ideia de que há um alto custo do trabalho, e por isso o sucesso desse tipo de propostas e medidas”, destaca o professor. “Estamos legislando e julgando com base em ‘achismos’ falsos, o que é perigosíssimo… e a população, mal instruída, aceita passivamente”.

Outros envolvidos, porém, defendem que a medida não traz prejuízos aos trabalhadores.
“As contratações, sejam elas para a atividade-fim ou atividade-meio, não resultam em subtração de nenhum direito dos trabalhadores”, defende Joelma de Matos Dantas, advogada e gerente executiva do Sindeprestem (Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros e de Trabalho Temporário no Estado de São Paulo). “Portanto, não há qualquer tipo de prejuízo”.

Dantas destaca ainda que não foi o Supremo quem estabeleceu a possibilidade da terceirização irrestrita, e sim a Reforma Trabalhista. “O STF apenas declarou que esta terceirização não é inconstitucional”, lembra. “Portanto, é mais uma decisão benéfica em favor da categoria, de forma justa e legal reafirmada pelo Supremo.

Batista, porém, defende que a afirmação de que a segurança jurídica dos trabalhadores está garantida não é totalmente verídica. “Essa afirmação leva em conta o mundo ideal e se baseia no fato de que o trabalhador terceirizado também deve ter a carteira assinada”, enaltece. “Mas, na vida real, o que se vê é que o trabalhador terceirizado não tem o apoio sindical que costuma ter o trabalhador da categoria principal da empresa, uma vez que os sindicatos de trabalhadores terceirizados são, via de regra, muito próximos ao patronato”.

Além disso, segundo ele, as empresas terceirizadoras têm muito menos solidez, muitas vezes sem qualquer capital social que possa garantir os pagamentos de direitos. “É muito comum, inclusive, que sejam de propriedade de ‘testas de ferro’, às vezes cooptados entre os próprios trabalhadores terceirizados, ou que sumam sem deixar rastros”, dispara. “A situação é de insegurança extrema”.

Número de profissionais terceirizados não deve aumentar
Segundo a gerente executiva do Sindeprestem, existem cerca de 13 milhões de brasileiros terceirizados no país atualmente. “A terceirização de serviços é comumente praticada em segmentos como portaria e controle de acesso, bombeiros civis, promotores de vendas, logística, dentre outros”, exemplifica.

Os números, segundo ela, não devem aumentar com as novas legislações. “A Lei da Terceirização ou a Reforma Trabalhista por si só não são capazes de gerar empregos, mas contribuem ao criar um ambiente de negócios mais seguro juridicamente”, acredita. “Os trabalhadores terceirizados são contratados dentro da legalidade, com todos os direitos trabalhistas previstos por lei. Portanto, é um setor responsável por gerar empregos formais e assim movimentar a economia do país”.

Dantas destaca ainda que a opção por contratações terceirizadas é do tomador de serviços, com base em estratégias de gestão. “A ampliação da terceirização, com respaldo legal, certamente trará mais segurança jurídica e confiança às empresas para contratar serviços especializados de acordo com a necessidade”, finalizou.

Terceirização não é pejotização
A opção de terceirizar profissionais não significa que os empregadores podem demitir os seus funcionários e recontratá-los posteriormente como Pessoas Jurídicas (PJ). Tal prática, conhecida no ramo jurídico como “pejotização”, é ilegal e sequer chegou a ser cogitada na Reforma Trabalhista ou no julgamento do Supremo.

“Se trata de uma tentativa de disfarçar eventuais relações de emprego que evidentemente seriam existentes, fomentando a ilegalidade e burlando direitos trabalhistas”, explica a advogada Katy Brianezi, da SBV Advogados. “A pejotização no ambiente de trabalho surge como opção aos empregadores que buscam a diminuição dos custos e encargos trabalhistas”.

Resumidamente, funcionários terceirizados são pagos pela empresa prestadora de serviços e tem seus direitos, como FGTS e férias, garantidos. Além disso, caso a prestadora não arque com eventuais débitos, a Reforma Trabalhista impõe à contratante (tomadora) do serviço tais custeios, garantindo assim os direitos trabalhistas dos funcionários. Caso os mesmos fossem pessoas jurídicas não possuiriam tais direitos estabelecidos em lei.

Desta forma, empregadores e funcionários devem ficar atentos, pois a prática é proibida e prejudica a “aplicabilidade dos direitos sociais garantidos aos empregados constitucionalmente”.

Entretanto, a legislação permite que o empregador realoque o funcionário em sua empresa como terceirizado. Para isso, porém, deve respeitar um prazo de 18 meses desde o desligamento do mesmo para realizar a readmissão.

Setor público também poderá terceirizar; entidade julga medida inconstitucional
Recentemente, o presidente Michel Temer sancionou o Decreto nº 9507/2018, que autoriza a contratação de serviços terceirizados para empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União.

Assim como no setor privado, a possibilidade já existia para o setor público, conforme estipulado na regulamentação anterior (Decreto n º 2271/1997); esta, porém, listava quais atividades podiam ser terceirizadas. Agora, novas possibilidades foram abertas.

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que representa mais de 4 mil juízes, imediatamente se posicionou contra o decreto, julgando o mesmo inconstitucional. Em nota oficial, a Associação afirmou que o decreto “ameaça a profissionalização e a qualidade dos serviços públicos e esgarça o patrimônio jurídico conquistado por seus servidores”.

Igor Daltro, advogado autônomo e professor de Direito Administrativo, defende o posicionamento da Anamatra. “Como principal barreira à constitucionalidade deste decreto temos o art. 37, II, da CRFB/88, que demanda a aprovação prévia em concurso público para a investidura em cargos e empregos públicos, em consagração a princípios da administração pública, como, impessoalidade, moralidade, isonomia, segurança jurídica e indisponibilidade do interesse público”, explica.

Segundo ele, a novidade apresenta ameaças a quem desejam realizar concursos públicos. “Para estes, o risco se limita a diminuição dos concursos nas estatais”, assegura. “Por outro lado, o Decreto não introduziu alterações na Administração Direta, autárquica e fundacional, preservando os concursos para carreiras já previstas em lei, para aquelas que envolvem o exercício do poder de polícia, que desempenham atividade de regulação, entre outras”.

Em contrapartida, o especialista defende que profissionais já concursados não devem acabar atingidos. “Segundo o Supremo Tribunal Federal, por força do princípio da motivação aplicável à toda Administração Pública, somente é admitida a dispensa dos empregados das estatais nos casos de justa causa”, detalha. “Portanto, ainda que não gozem de estabilidade, há certa segurança em seus vínculos funcionais”.

Por fim, o advogado e professor defende que a medida é vantajosa ao Poder Público no viés financeiro, uma vez que, segundo ele, esta é a natureza das terceirizações. “Contudo, um questionamento nos parece razoável: como um Governo que deixou de realizar concursos públicos ou não os previu nos exercícios financeiros posteriores para economizar irá dispor de orçamento para tais terceirizações?”, indaga.

Contra a terceirização no Setor Público, a Anamatra estuda ir ao Supremo Tribunal Federal questionando o Decreto nº 9507/2018.

 

Fonte: Contabilidade na tv

 
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